Passageiros clandestinos: as aves que pegam carona em navios

Passageiros clandestinos: as aves que pegam carona em navios

A migração dos pássaros é um espetáculo fascinante que ocorre em todo o mundo e impressiona biólogos, ornitólogos e entusiastas da natureza. Todos os anos, milhões de aves viajam para lugares diferentes em busca de alimento, abrigo e melhores condições climáticas. 

Porém, não é segredo que a jornada épica dessas criaturinhas conta com muitos obstáculos árduos, e aparentemente, elas encontraram uma forma inusitada e inteligente de descansar suas asas, recuperar o fôlego e ainda cruzar longas distâncias: pegando caronas em navios.

Gaiatos no navio

(Fonte: Getty Images/Reprodução)(Fonte: Getty Images/Reprodução)

Esses exóticos passageiros clandestinos não são exatamente uma novidade nas embarcações, com tripulações do mundo inteiro relatando histórias de diversas espécies ocupando conveses ao redor do mundo, seja por alguns minutos ou até mesmo dias, com algumas até fazendo troca de barcos ao longo do percurso.

Esse fenômeno engraçado ficou conhecido como migração assistida por navios, e passou a ser estudado por pesquisadores de forma sistemática em 2021, quando Maurizio Sarà, um zoólogo da Universidade de Palermo, na Itália, realizou um cruzeiro de pesquisa por um mês através do Mediterrâneo.

(Fonte: Getty Images/Reprodução)(Fonte: Getty Images/Reprodução)

Inicialmente, o objeto de Sarà era observar espécies marinhas como tartarugas e golfinhos, porém conforme ele passou a notar a quantidade de pássaros terrestres pousando no barco, decidiu acompanhar essa situação, notando que, em média, três surgiam todos os dias, parando normalmente por volta de 42 minutos, ou até mesmo decidindo pernoitar por ali.

Fazendo uma extrapolação a partir de suas observações, o zoólogo estima que até quatro milhões de aves aproveitam para descansar em embarcações pelo Mediterrâneo durante a migração de primavera, e que algo semelhante também ocorra em outros oceanos.

Viajando com mais conforto

(Fonte: Pixabay/Reprodução)(Fonte: Pixabay/Reprodução)

Durante suas longas jornadas migratórias, os penudos enfrentam ventos fortes e tempestades, e quando cruzam os mares, podem ficar sem água ou alimento por um longo tempo, tendendo a descansar em ilhas para comer ou esperar o fim de condições climáticas adversas.

Porém, esses pequenos pedaços de terra são mais raros do que barcos, afinal, se considerarmos apenas a quantidade de navios comerciais, temos cerca de 90 mil espalhados pelas águas do mundo todo.

Sarà acredita que os pássaros desenvolveram essa estratégia para se acomodarem a era moderna, utilizando os milhares de cargueiros, petroleiros e cruzeiros como uma forma de viajar com mais conforto e evitar adversidades.

(Fonte: Pixabay/Reprodução)(Fonte: Pixabay/Reprodução)

“Uma pequena parada pode ser suficiente para evitar a parte mais cansativa de atravessar uma célula de baixa pressão atmosférica ou para se recuperar do estresse fisiológico que o voo migratório acarreta”, escreveu o zoólogo em um de seus artigos mais recentes.

Para Alexander Lees, um biólogo conservacionista da Universidade Metropolitana de Manchester, na Inglaterra, a estimativa do italiano pode ser um tanto alta, mas ele considera que a migração assistida por navios realmente é algo que vale a pena ser estudado a fundo.

Segundo Lees, o Comitê de Registros da União Britânica de Ornitólogos recebe dois a três relatórios anualmente sobre aves que não são nativas das áreas nas quais são avistadas, levantando suspeitas que parte delas chegou até ali com a ajuda de uma embarcação.

Desbravando novas terras

(Fonte: Pixabay/Reprodução)(Fonte: Pixabay/Reprodução)

Essa nova tática não só auxilia na parte do conforto, mas também pode permitir que certas espécies colonizem uma nova região. Por exemplo, o corvo-indiano é conhecido por seu comportamento não migratório, porém, nos últimos anos, muitos deles passaram a chegar na Holanda vindos de barcos do sul da Ásia, estabelecendo uma colônia de reprodução nos arredores de Roterdã.

Embora a migração assistida por navios ainda precise de mais estudos, ela é uma amostra surpreendente de como outros seres do nosso planeta acharam uma forma de utilizar as criações humanas para facilitar a própria vida. E afinal, quem não adoraria dividir uma viagem de barco com passageiros clandestinos tão adoráveis?